19/05/2008

Reencontrar Giacometti - Correia da Fonseca

Acabei por ver Polifonias e saltou-me ao caminho a vontade desvairada de não ver mais televisão, ao menos este ano. (...) Para não sobrepor nada áquelas imagens, áqueles sons. Aquela comoção nascida do reencontro com Michel Giacometti decerto, mas também da surpresa de um filme assim, (...) de uma beleza majestosa que parecia subir até aos deuses e, contudo, tem cheiro e sabor a terra, hálito de homens, fraternidade de gentes. (...)

Polifonias
demonstrava a evidente grandeza do material que Michel Giacometti recolheu e preservou. O canto, é claro, mas mais que isso : as gentes. Os rostos com máscaras sólidas sob as quais tremula a emoção. Os homens que cantam enlaçados, orgulhosos de serem homens e de cantarem assim. (...)

A evocação de Michel Giacometti chegou-nos enquadrada, como o próprio Michel desejaria, numa espécie de cenário ciclópico que integrava as paisagens belas mas nunca bonitinhas, os cantos solenes como peças sagradas e as rugas humanas. Olhava-se, ouvia-se, e era-se atravessado por um frémito de espanto. Pela beleza do filme, sem dúvida. Também pela descoberta de que, afinal, também é possivel que a televisão nos permita momentos assim. (...)

Correia da Fonseca
Diário do Alentejo - 2 Janeiro de 1998

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